PRODUÇÃO ACADÊMICA



 A PRESENÇA JUDAICA NA BAIXADA FLUMINENSE


O estabelecimento em terras baixadenses da comunidade judaica e as razões  de sua presença é um grande exercício para a interpretação e compreensão da história. No entanto, algumas questões são bastante obvias, vejamos algumas delas.
Primeiramente devemos entender que boa parte do século 16 até meados do 17 o Brasil fazia parte da União Ibérica.  A presença do Estado Português, por falta de um Rei não se fazia sentir na colônia o que deixava regiões menos importantes do ponto de vista econômico a mercê dos interesses locais.
O segundo foi à inquisição que forçou a ocupação do território português além mar e conforme diz Mircea Buesco e Vicente Tapajós em História do Desenvolvimento Econômico do Brasil p. 76... “Houve, contudo, outro fato histórico que ajudou muito a solução do problema populacional: foi à perseguição dos judeus, iniciada pela Inquisição dentro do espírito radical da Contrarreforma, e que recrudesceu uma vez no início do século 16, outra vez no século 17, provocando forte emigração para o Brasil, sob o aspecto de “cristãos novos”.
O terceiro aspecto da presença judaica na Baixada são os elementos de ordem geográfica e natural. A topografia da baixada com inúmeros rios navegáveis e em especial as terras de Meriti com suas 50 elevações em forma de morros e consequentemente com inúmeros vales, com fontes d’água natural, florestas virgens, aldeamentos indígenas já dizimados. Formavam sítios ideais para o estabelecimento de engenhos e ao mesmo tempo protegerem-se das práticas da lei mosaica.   
O quarto fator era os dois mundos que separavam as terras portuguesas na América, as do nordeste e as do sul. No nordeste ficava a grande empresa açucareira, com engenhos de grande porte, grande comércio de escravos. Grandes lucros obtinham a metrópole, o que exigia do Estado Português uma presença constante e permanente. Já o sul no século 16 e 17 não apresentavam lucros e rendas que atraísse o Estado e não ser o perigo eminente e constante dos franceses, como foi à invasão no Rio de Janeiro em 1560/1565.
A presença de cristãos novos em grandes números na área do recôncavo despertava e aguçava no aparelho inquisidor português o perigo da expansão do judaísmo. É bom lembrar que em Portugal ainda estava presente o espírito cruzadista contra o não católico. Anita Novinsky professora da USP diz que a atuação da Inquisição no Brasil é um tema ainda muito pouco debatido.  

Os engenhos e a prole sefardita nas terras da baixada.

            Antônio José da Silva, nascido em 08 de maio de 1705 no Engenho do Avô materno Balthazar Rodrigues Coutinho, localizado no bairro da Covanca em Meriti, era filho dos cristãos-novos João Mendes da Silva, advogado e poeta e de Lourença Coutinho. É considerado o mais representativo autor dramático português em meados do século 18, sendo-lhe geralmente atribuídas oito óperas joco-sérias – comédias musicadas de bonifrates – que ainda hoje são levadas à cena por várias companhias teatrais. Chamado o Judeu pela sua ascendência hebraica. Foi perseguido pela Inquisição e levado várias vezes perante o tribunal até que foi condenado a morte.
Os Sefarditas tornaram-se senhores de numerosos engenhos durante o domínio dos habsburgos da Espanha, e a cidade do Rio de Janeiro dominava no final do Séc. 17 o controle destas unidades de produção. José Gonçalves Salvador afirma que “em 1607 o Rio conta com 14 engenhos. Vinte anos após frei Vicente dá-lhe 40. Aumenta a imigração e em meados do século, apenas Salvador de Sá tem cinco engenhos. O comércio se reativa e a metade da população é formada de hebreus. A Capitania prospera e nos dizeres de Salvador Correia de Sá à El rei em 1639, ela constitui a melhor de todas do Brasil”.
            Pelas margens do Rio Meriti-Pavuna havia os engenhos com Invocação de São Francisco na Pavuna, possuía capela, capelão e pertencia a Alexandre Soares Pereira. João Correia Ximenes era dono das terras margeadas pelo mesmo rio. Nas encostas do Jericinó (Nilópolis) e arredores estavam assentadas as famílias Azeredo Coutinho, os Lucena Montarroio, Álvares Pereira, os Correia Ximenes e outros.
            O neto de Miguel Cardoso, seu homônimo, foi batizado na freguesia de São João Baptista de Trairaponga (em Meriti). Entre os Azeredo Coutinho que vieram do Espírito Santo está à cristã-nova Esperança, neta de Bárbara da Rocha, filha de Isabel de Azeredo Coutinho e foi casada com Diogo de Lucena Montarroio. Era sobrinha de Miguel Cardoso, com sinagoga em casa. Esperança era dona da imensa ilha dos Sete Engenhos (Ilha do Governador que tinha pertencido ao segundo governador da cidade do Rio de Janeiro Salvador Corrêa de Sá) e da Fazenda Jacutinga próximo a Meriti. Além das atividades administrativas dos engenhos, era plantadora de mandioca, banana e tinha pasto para gado.  Foi única nos cabedais, quando presa no Rio. Esperança no tribunal de inquisição não informou o nome do avô, porém, diz que tenha sido João de Azeredo Coutinho, também do Espírito Santo. Esperança é condenada a morte no Tribunal de Inquisição.

As Heranças Sefardita

Nomes bem familiares em nosso cotidiano como: Cardoso, Silva, Araújo, Soares Pereira, Paredes, Azeredo, Lucena, Montarroio, Roiz Andrade, Ximenes, Soares de Mesquita, Medanha, Moreira, Moura, Fogaça, Vale da Silveira, Fernandes Teixeira, Sampaio, Nunes Vizeu, Mendes, Silvestre, Caldeira, Coutinho, Barros, Maris, Gomes da Silva, Baltazar Borges, Duarte, Costa Moreno, Fernandes Vitória, Duarte de Sá, Correia de Sá e Benevides, Manuel do Couto, Barros de Miranda, Machado Homem, Rodrigues Andrade, Paz, Ramirez, Leão, Guterrez, Mourão, Brum, Melo de Castro, Aborim, etc. ... nos faz lembrar de um membro da família, de um amigo ou de um conhecido. Atrás de cada sobrenome está um judeu cristão-novo, que passou de uma forma direta ou indireta pela Baixada nos séculos 17 e 18.
O povo brasileiro, em especial o do recôncavo é o resultado de uma intensa miscigenação étnica e cultural, o que fez gerar uma pluralidade de costumes e tradições sem precedentes na história. Os costumes e as tradições são traços tão fortes que acabaram por moldurar os comportamentos e os fazeres. Essa diversidade deve ser reconhecida, respeitada e valorizada.
Rita Miranda Soares escrevendo sobre os costumes sefarditas nos diz: “Resgatar esses valores é resgatar a própria cultura e a tradição que se viu camuflada, esquecida em muitas casas, simplesmente para que as famílias pudessem fugir às mãos de ferro da Inquisição”.
No dizer de Vital Ben Waisermman, o povo judeu vivendo há dois mil anos na diáspora, forçado a mudar constantemente de país, acabou criando e fortalecendo suas raízes também através de sua culinária, transmitida de geração em geração. Assim, a comida acabou sendo o símbolo da continuidade, o laço com o passado ainda que influenciada pela cultura dos países nos quais as comunidades judaicas se estabeleceram ao longo dos séculos.
O cotidiano forçou o nascimento de expressões que surgiram dos costumes e das tradições arraigadas como: Ficar a ver navios; Pensar na morte da bezerra; Passar a mão na cabeça; Passar mel na boca; Para o santo; Pagar siza; Vestir a carapuça; Deus te crie; Pedir a bênção; Entrar e sair pela mesma porta traz felicidade; Varrer a casa da porta para dentro; Apontar estrelas faz crescer verrugas nos dedos etc.
            É bom mencionar que não é politicamente correto usar o verbo judiar e o substantivo judiação, ambos tem o sentido e significado de maltratar, torturar, atormentar. Judeu tem sido apresentado com o significado de usurário. Ambas as conotações passa um sentido negativo e não devem ser usadas, assim estamos preservamos a memoria daqueles que contribuídos para formar as matrizes da cultura Brasileira. 

                                                                       Por Gênesis Pereira Torres







 VISITA DO PRESIDENTE GETÚLIO VARGAS À               BAIXADA FLUMINENSE                       



A deposição do presidente da República Dr. Washington Luis em outubro de 1930, foi seguida com a instalação de uma junta governativa até a chegada ao Rio de Janeiro no mesmo ano, do comandante supremo da revolução, Getulio Vargas.
Como chefe do Governo Provisório da República, este presidente iniciou uma série de incursões às periferias do Rio de Janeiro, provavelmente com o propósito de solidificar o poder das lideranças estabelecidas no início de seu Governo.
Durante a “febre” econômica das laranjas na região de “Iguassú”, Getúlio Vargas programou uma visita a esse Município em junho de 1931, para inaugurar ali, várias obras de conteúdo social e econômico: o lançamento da pedra fundamental do “Hospital de Nova Iguassú”, (uma velha reivindicação do povo iguaçuano), a inauguração do “Packin House” central, para a seleção  e embalagem das laranjas a serem exportadas, e o calçamento da Rua Dr. Getúlio Vargas, eram seus objetivos principais.
O jornal “O Nilopolitano”, “Órgão dos Interesses do Município de Iguassú”, em sua edição de 28 de junho daquele ano, registrou para a posteridade esse episódio; estampando em manchete ufanista: “A Visita do Grande Presidente Getúlio Vargas”, este Órgão da Imprensa, dedicou quase toda a edição ao “incomum acontecimento”.
  Acompanhado do Ministro da Agricultura e demais membros de seu governo, Getulio Vargas, “entrava em Nilópolis ás 9 horas, sob verdadeira apoteose popular”, saudado por uma salva de vinte um tiros. Na Av. Mirandela especialmente decorada, “viam-se bandeiras em profusão enfeitando um longo trecho da Cidade, intercaladas por vários arcos festivamente engalanados com legendas dedicadas ao grande Presidente da República”.
A Banda de Música Estrela da Aurora executou o Hino Nacional, sendo acompanhada pela população que se aglomerava ao longo das calçadas em sinal de respeito ao chefe da Nação. Em seguida, este foi “saudado em nome do Município pelos Drs. Manoel Reis e Arruda Negreiros. Seguiram-se os cumprimentos dos Drs. Athayde Parreiras, juiz da comarca de Iguassú, Serpa de Carvalho, promotor público e Mário Guimarães, delegado regional.”
Durante o trajeto na Av. Mirandela, os carros pararam sob “um arco de grande efeito”, ocasião em que “sua excelência”, liderando a passeata, convidou o Dr. Manoel Reis a “tomar lugar no seu carro”. Em sua companhia achava-se seu ajudante de ordens tenente Menna Barreto e o diretor do Fomento Agrícola, Dr. Torres Filho.
Seguindo o carro do Presidente, viam-se outros veículos conduzindo vários acompanhantes: “Dr. Salgado Filho, delegado auxiliar; Péricles da Silveira, secretário do Ministério da Cultura; Ottoni Freitas, assistente, pessoas gradas e o representante do Diário da Noite”
 Naquela ocasião o diretor do jornal “O Nilopolitano”, João de Moraes Cardoso, (a quem recorremos para registrar esses dados), “em meio às aclamações que se prolongavam na Av. Mirandela”, cumprimentou S. Ex. em nome do jornal.      
A multidão se aglomerava nas ruas buscando cumprimentar o “grande presidente em sua passagem, acompanhado de salvas e girândolas que espocando fortemente no ar, emprestavam um ambiente de festividade e alegria que a população exultava à passagem da comitiva presidencial”.
Dirigindo-se para Bel Ford Roxo, o Presidente parou na praça central, recebendo a ovação popular, sendo saudado pelo Sr. Coelho da Rocha e deste recebendo o convite para se dirigirem ao seu solar. Uma majestosa construção no alto da colina “onde se descortinava um lindo panorama”.     
Ali “foi servido um “lunch”, e saudado pelo Sr. Diomedes Figueiredo de Moraes, que terminou pedindo o aumento dos transportes da via férrea Rio d´Ouro, para maior escoamento dos produtos da lavoura de Bel Ford Roxo”. Durante a retirada do cortejo, uma banda de música abrilhantou a despedida.

A caminho de Iguassú, sede do município, as recepções festivas continuaram, com inaugurações e missa campal, culminando com um almoço, oferecido pelo Dr. Manoel Reis em sua residência. Antes de voltar em companhia do anfitrião, o presidente visitou a fazenda de Madureira, “onde apreciou excelentes frutos”.



                                                                                           Guilherme Peres

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